Atingidos marcham em Porto Alegre por reconhecimento e reparação
Em ato unificado com MPA, MTST e FETRAF, população atingida pressiona por moradia e segurança alimentar um ano após a enchente no RS
Publicado 16/05/2025 - Atualizado 27/05/2025

Um ambiente seguro e saudável, comida de verdade e moradia digna. São partes de nossos direitos mais básicos, mas que, mesmo um ano após a enchente no Rio Grande do Sul, não foram garantidos aos atingidos. Enquanto o dinheiro público segue beneficiando quem menos precisa, os atingidos que ainda sofrem as consequências da enchente – das zonas rurais às periferias das grandes cidades – tomaram as ruas de Porto Alegre nesta quinta-feira (15). Em marcha pelo centro da capital, exigiram reparação e justiça.
“Estamos indo para rua para pedir soluções, porque estamos cansados de esperar. São muitas promessas e os recursos não chegam nas bases. Quem mais precisa é quem menos está recebendo. Os recursos, tanto estaduais quanto federais, demoram muito e as emergências são agora!”, declarou a atingida da cidade de Estrela, Juraci dos Santos.
Para denunciar o descaso e exigir medidas concretas de reparação, o ato uniu o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e a Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras da Agricultura Familiar do Brasil (FETRAF).
A pauta definida pelos atingidos do Rio Grande do Sul apresenta seis pontos fundamentais: direito à moradia; o à água e energia elétrica a preço justo e de qualidade; segurança dos atingidos com a reforma e ampliação do sistema de proteção das cidades; luta pela recuperação das estruturas públicas de saúde e educação; garantia de segurança alimentar; e a luta pela participação dos atingidos nos processos de decisão.
Entre as reivindicações mais urgentes, estão os pontos relacionados à alimentação e à moradia. Neste aspecto, a reivindicação é pelo reconhecimento como atingido, pela reconstrução das comunidades, bairros e sistemas de proteção, pelas reformas das moradias, pelo reassentamento comunitário, adequado e definitivo e, por fim, pela regularização para ar políticas de habitação.
A atingida da Ilha dos Marinheiros, em Porto Alegre, Pamela Chaves, conta que o MAB a ajudou a compreender a importância da luta e a força da mobilização coletiva:
Todos nós temos nossos direitos e com o MAB somos mais fortes! Aprendi a lutar, aprendi que todos têm espaço, que todos somos iguais e que juntos, organizados, vamos mais longe. Podemos e devemos sair às ruas e lutar, sem ter medo. Agora me sinto útil e muito orgulhosa em poder reivindicar a pauta dos atingidos.
Iniciando em dois pontos diferentes do centro da cidade, uma parte do grupo saiu da Esquina Democrática e outra do Largo Zumbi dos Palmares. A primeira parada foi no prédio que concentra vários setores do Governo Federal em Porto Alegre, conhecido como ‘Chocolatão’. À tarde, o grupo seguiu até a Assembleia Legislativa e ao Palácio Piratini, sede do governo do Estado.



Negociações da pauta e conquistas para os atingidos
Como parte da Jornada de Lutas, o MAB realiza durante este mês uma série de reuniões com instâncias do governo federal e estadual para apresentar a pauta de reivindicações em favor dos atingidos no Rio Grande do Sul. O objetivo é pressionar por políticas públicas que garantam seus direitos.
Entre os encontros já realizados estão com o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, em Brasília, e também com a Secretaria de Desenvolvimento Rural do Rio Grande do Sul, junto com MTST, Fetraf e MPA.
Na manhã desta quinta-feira, o grupo debateu com a Secretaria Executiva do Conselho do Plano Rio Grande formas de o e a garantia da aplicação do Fundo do Plano Rio Grande (FUNRIGS) para reparação aos atingidos a partir da pauta do MAB. No encontro, estava também a Secretaria de Habitação e Regularização Fundiária do estado.
Uma conquista importante da jornada de luta desta quinta-feira foi o início da construção do projeto proposto pelo MAB como PAA Reconstrução. A iniciativa, em parceria com FETRAF e MPA, busca a segurança alimentar da população atingida através do Programa de Aquisição de Alimentos, com produtos provenientes da agricultura familiar que são reados diretamente às famílias atingidas pela enchente.

De início, já foram garantidas mil cestas básicas aos atingidos e o compromisso de seguir buscando formas de construir o Programa mais permanente. Depois de reunião com membros das direções dos Movimentos, o anúncio foi feito aos atingidos pelo presidente da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), Edegar Pretto:
“Reconheço o trabalho excepcional do MAB desde o início das enchentes do Rio Grande do Sul e anuncio que, a partir de segunda-feira, as primeiras mil cestas da agricultura familiar estão disponíveis para os atingidos do MAB”, declarou Pretto.

Ainda durante o dia, os Movimentos também foram recebidos pelo representante da presidência da Assembleia Legislativa do RS, Miguel Rosseto (PT/RS) e pelo governador em exercício, Gabriel Souza (MDB/RS). Para os próximos dias estão previstos encontros com a Casa Civil e os Ministérios das Cidades e do Desenvolvimento Social, em Brasília, e também com a Presidência da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul e as comissões relacionadas à pauta.
Outro progresso importante na negociação dos atingidos foi em relação à moradia. Enquanto alguns pontos – como condições para reformas das casas – não evoluem, a proposta de reassentamentos das comunidades parece ter obtido avanços nas tratativas. Leonardo Maggi, integrante da coordenação do MAB, representou o Movimento nas reuniões durante todo o dia e avalia:
“Há uma indicação bem razoável de dar seguimento à construção de reassentamentos urbanos pelas entidades do MAB, especialmente no Vale do Taquari. Isso é uma parceria que exigiria Prefeitura, Governo do Estado e Governo Federal. Por outro lado, o tema das reformas é uma condição muito pessimista, que não se vê possibilidade de encaminhamento de qualquer coisa no curto prazo”, relatou Leonardo.
Um alerta importante, segundo ele, é de que os governos federais e estadual – e mesmo os municípios – não conhecem a realidade atual da população atingida. “Existe uma ideia falsa de que o plano está resolvido ou está encaminhado. Não está. Existe essa impressão falsa de solução. Bom, desfeita essa noção, nós temos que brigar por soluções. Mesmo que tenhamos conseguido iniciar esses processos de ação, ainda nessa fase vão ser muito incipientes e talvez não sejam para a totalidade da população atingida. Mas são os”, avalia Maggi.
